terça-feira, 1 de março de 2022

2º Ano :: 1º Bim :: (aulas 1 e 2) - As origens do pensamento ocidental


1. Filosofia é coisa de ateu ?? (pensamento científico grego vs. pensamento mítico)

A filosofia carrega, para boa parte das pessoas,  o estigma de ser considerada como um campo de saber essencialmente ateu, cuja existência se justifica pelo objetivo de desafiar o que é superior e sagrado.

Certamente esse tipo de ideia existe por causa de sua origem. A filosofia nasceu  como uma prática contestadora em relação aos modos de entendimento e explicações  que o mito oferecia, ou seja, contestar era uma forma de abrir espaço para encaixar uma outra forma de entender o mundo, uma forma mais natural e menos sobrenatural (considerando "sobrenatural" como sendo tudo aquilo que está acima da natureza e que de alguma forma exerce uma força decisiva sobre ela).

A filosofia (que nesta época era caracterizada como "filosofia da natureza") surge como uma forma de pensamento e conhecimento  diferentes daqueles que as pessoas estavam acostumadas, e as pessoas estavam acostumadas com explicações sobrenaturais, onde o mundo é regido pelas vontades divinas. A filosofia iniciou algo inédito e que talvez seja a causa de seu estigma de "saber ateu": pensar a natureza pela própria natureza. Se há mistérios no mundo que vivemos, as respostas para os mesmos residem no próprio mundo e não fora dele como dizia a tradição.


O surgimento desta nova perspectiva que buscava compreender a natureza por ela mesma se deu em meados do séc VII na Grécia (veja a linha histórica abaixo). Foi lá que esta forma de pensar racional passou a se colocar contra formas vigentes. Não no sentido de destruir e acabar com a religiosidade grega com seus deuses e deusas, mas de colocá-la em seu devido lugar religioso. Assim, o conhecimento religioso ficaria apenas voltado para questões religiosas e espirituais. As demais questões deveriam agora ser explicadas a partir de um pensamento mais racional, ou seja, aquele que fazia uso da razão e que buscava um sentido mais lógico e coerente. 




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2. Esse "pensamento racional" surgiu com os gregos ?

Certamente não foi na Grécia que esta nova forma de pensar surgiu, até porque  não se trata de uma forma "nova" de se pensar. Vejamos o porquê. 

O povo grego deve parte de sua origem e sua cultura graças ao contato que teve com outros povos, e é a partir desta relação com os demais povos (tenham sido eles vizinhos próximos ou distantes) que o grego passa a compreender o mundo de forma racional. Deste modo, não se trata de um aspecto da natureza grega (ela não nasceu sabendo), mas sim de relação com outros povos que já haviam desenvolvido o pensamento racional mesmo que estes povos jamais tenham utilizado esta forma de pensar para constestar o sentido de seus próprios deuses,  o enfrentamento e a busca por respostas mais claras à luz da razão é sem dúvida uma caracteristica do povo grego tal como dissemos antes. Mas o pensamento organizado, calculado, projetado, etc, este já vinha sendo feito a pelo menos uns 2500 anos antes da civilzação grega.


3. O comércio e sua influência sobre a formação do pensamento racional



A civilização que vivemos no presente deve ao comércio o legado de sua existência, isso se consideramos que para o comércio existir é necessário que haja uma "ordem" no pensamento. A explicação é simples: um comerciante que não organiza seu próprio estoque - por menor que seja este - não vai conseguir saber o que tem a mais e o que está faltando. Além disso, se ele não organizar seus produtos classificando-os por tipo, certamente ele não conseguirá vender, ou seja, não haverá comércio. Isso significa que a prática do comércio obriga aqueles que dela desejam fazer parte a se organizar. Quem compra e quem vende (mão dupla da relação comercial) deve saber o que está vendendo e comprando o que gera uma necessidade de sentido de organização. 





O momento histórico disso ocorreu na antiguidade por volta de 3000 a.C onde o pensamento racional que surge com a prática do comércio começa a se fazer presente em outros espaços das antigas sociedades como por exemplo na construção civil, naval,  na estratégia militar, na agricultura e na domesticação de animais. Estes saberes recebiam agora influência de um pensamento ordenado, planejado enfim, racionalizado. Desta forma é correto dizer que




 "conceitos e práticas das ciências, tais como classificar, ordenar, relacionar, separar, discernir, comparar, prever são conceitos das próprias práticas comerciais. Esses conceitos surgiram na história das ciências e da filosofia como reflexo das próprias relações materiais de existência dos homens, nas práticas de intercâmbio material e intelectual, desde as primeiras sociedades."1



Como dito antes, essa atitude racional do pensamento passou a se fazer presente em outras áreas , como por exemplo a construção de um templo: além de ser um feito em prol da religiosidade (estas sociedades de 3000 a.C eram teocráticas, ou seja, governadas por mortais respresentantes diretos de deus ou dos deuses) movimentava também a economia pois implicava em cálculos de engenharia, nos trasportes e na busca por materiais além do cálculo da distância e dos dias que esses materiais levariam para chegar (o que hoje em dia chamamos de logística). Um exemplo disso são as pirâmides egípcias, pois o que se sabe que as pedras utilizadas em sua constução não existiam no lugar, ou seja, vieram de outro lugar a uma certa distância. Definitivamente era necessário calcular tudo isso, caso contrário nada seria feito.

O interessante é que mesmo estas sociedade sendo altamente religiosas isso não impossibilitou a prática racional no cotidiano das pessoas, desde uma simples compra no mercado local até a construção de um enorme templo, tudo já funcionava impulsionado pela racionalidade. O que os gregos mais tarde fizeram foi aproveitar este legado racional do passado para confrontar um conjunto de respostas os quais eles (sobretudo os filósofos) julgavam não responder mais às antigas dúvidas. Não bastava mais aceitar a ideia de que o mundo surgiu de "um encontro amoroso entre a noite e o dia". Era necessário algo que fizesse mais sentido, e a razão parecia ser a via adequada para estas novas respostas.






Por Matheus G.F Pinto



Atividade da aula


1) Por que a filosofia carrega até hoje a fama de ser um pensamento ateu?
2) Qual a diferença da narrativa mítica para filosófica?
3) Por que o pensamento racional não era exclusividade dos gregos e já existia em meados de 3000.A.C
4) Qual o papel do comércio no surgimento da filosofia?
5) Por que o mito não acabou ?






1. http://filosofonet.wordpress.com/2007/09/25/racionalidade-e-a-origem-da-civilizacao-ocidental/


TOURINHO, Carlos Diógenes. Saber Fazer Filosofia Da Antiguidade à Idade Média Carlos Diógenes Tourinho - Aparecida - SP: Editora Ideias & Letras , 2010


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